segunda-feira, 23 de abril de 2012


Moda brasileira quer brilhar além das passarelas

Grifes brasileiras voltam a ser assediadas pelos investidores; processo de profissionalização, marcado por turbulências nos últimos anos, persistirá

Beatriz Ferrari
Modelos no backstage da marca Zigfreda durante o SPFW
Marcas brasileiras voltaram a ser assediadas por empresas e fundos de investimento (Mauricio Lima/AFP)
Já dizia a consultora de moda Glória Kalil: “a moda brasileira brilha, mas não vende”. Por muito tempo, especialistas em gestão de moda reclamaram que o burburinho provocado pelos dois principais eventos do setor no país – o São Paulo Fashion Week e o Fashion Rio – era desproporcional ao volume de negócios que geravam. Nos últimos quatro anos, contudo, o segmento começou a se mostrar como uma possibilidade interessante de investimento. O melhor retrato disso foi a grande movimentação de aquisição de grifes, sobretudo em 2008, que marcou o início do processo de formação de grupos empresariais de moda (veja quadro). Essa tendência – que teve altos e baixos no período – não sofreu reversão e deve se intensificar. Consultores com bom trânsito no setor informam que marcas como Animale e Victor Hugo têm sido assediadas por empresas e fundos de investimento nacionais e estrangeiros. Já a Malwee, grande malharia do sul do país, avalia a possibilidade de lançar ações na bolsa, relatam fontes do site de VEJA. A empresa nega.
Este movimento de profissionalização tem sua lógica. O aumento das taxas de emprego e renda, associado à ascensão da classe média, torna tudo o que é ligado a consumo no Brasil naturalmente atrativo. Soma-se a isso o fato de que as pessoas querem, cada vez mais, adquirir produtos que ‘costuram’ qualidade, beleza e glamour. Pesquisa do Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI) aponta, por exemplo, que só o varejo de vestuário movimentará 146 bilhões de reais neste ano, um crescimento de 60% ante 2007. Do ponto de vista das grifes, a associação com uma companhia capitalizada também é uma saída natural. Essas marcas – que geralmente nascem do talento de um estilista ou de um grupo deles – começam a ter, à medida que crescem e ficam famosas, problemas de grande empresa. Como não são ‘experts’ em temas complexos, como distribuição, política de vendas e engenharia financeira, os estilistas passam a ver com bons olhos a possibilidade de entregar essa parte do negócio a quem é especialista no assunto, o que lhes garante recursos para expandir lojas, exportações, etc.

Os grandes nomes da moda no país

Conheça as empresas que estão por trás de famosas marcas brasileiras
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InBrands

O empresário Nelson Alvarenga é fundador da Ellus e sócio da InBrands
Criada em 2008, a holding InBrands é fruto da associação entre a gestora de recursos Vinci Partners, do banqueiro Gilberto Sayão, e a Ellus, do empresário Nelson Alvarenga. A expectativa na época, segundo consultores ligados à empresa, era adquirir novas marcas e assim faturar 1 bilhão de reais neste ano. Os planos, no entanto, não se concretizaram. A InBrands faturou 530 milhões de reais no ano passado e a previsão revista para 2011 é de 800 milhões de reais.
A avaliação dos especialistas é que, no início das operações, a holding comprou grifes com imagem sólida, voltadas ao público AB, mas não necessariamente com estrutura comercial organizada e volume de vendas adequado a seus objetivos. “No começo, a  InBrands não comprou marcas, mas sim promessas”, afirma o consultor em gestão de moda Silvio Chadad. Além da Ellus, a Inbrands adquiriu em 2008 as grifes Isabela Capeto e Alexandre Herchcovitch, além de uma participação na Luminosidade – organizadora do São Paulo Fashion Week e do Fashion Rio.
Nos últimos anos, tornou-se evidente certo descompasso entre os objetivos do grupo e das marcas. “A InBrands precisa entender que essas marcas não são como a Hering, que tem capacidade de produção elevada”, explica o consultor Carlos Ferreirinha, especialista em mercado de luxo. As divergências internas teriam causado a saída, em maio, da estilista Isabela Capeto.
Há sinais, entretanto, de que a holding já começou a fazer escolhas acertadas. Em 2010, a InBrands anunciou a associação com a Cia das Marcas, que é dona da Richards e da Salinas, ambas grifes muito bem estruturadas. Em fevereiro, fechou parceria com a BR Labels e adquiriu 100% do capital da VR Menswear e Vr Kids. No mês passado, formalizou junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) a intenção de abrir capital.
Portfólio de marcas
Ellus
2nd Floor
Alexandre Herchcovitch
Cia das Marcas (dona da Richards, da Salinas e da Bintang)
BR Labels (dona da VR MenswearVR Kids e Mandi)
Luminosidade (organizadora do SPFW e do Rio Fashion)
O fato de ser uma aliança natural, no entanto, não quer dizer que seja fácil. Ao contrário, o processo de profissionalização em curso tem sido marcado por percalços. De 2008 para cá, mais estrondosos que os anúncios de acordos milionários no segmento foram os desentendimentos entre investidores e estilistas (confira a movimentação do setor). A I’m, por exemplo, que nasceu naquele ano como grande holding da moda e que tomou para si a condição de símbolo dos novos tempos, só durou até 2009. Segundo especialistas, o quadro turbulento é fruto da própria falta de amadurecimento do mercado. Por um lado, investidores deixaram-se levar, nos últimos anos, pela euforia e acabaram se associando com marcas com problemas sérios de gestão. Por outro, criadores assinaram os contratos sem ter muita noção do papel que deveriam desempenhar na nova fase da marca. A grande fonte de desentendimento, aliás, foi o fato de ambas as partes terem se associado sem absoluta clareza prévia de todos os detalhes do negócio.
No exterior, por outro lado, o primeiro conglomerado de moda bem-sucedido, o francês LVMH, dono da marca Louis Vuitton, formou-se ainda na década de 1980. “O setor está passando por um bom momento no Brasil, mas a maior parte das empresas, a despeito de sua visibilidade, enfrenta dificuldades de atrair capital. É que muitas delas são ainda bastante informais e não têm planos de negócios claros”, explica o consultor Carlos Ferreirinha, especialista em mercado de luxo. Isso evidencia que a tão esperada profissionalização ainda não chegou ao patamar esperado. “Os estilistas estão começando a ver só agora a importância de uma gestão comercial bem estruturada”, explica o consultor em gestão de marketing de moda Silvio Chadad. Em resumo, o Brasil ainda tem um processo de amadurecimento pela frente. Mas os especialistas são unânimes em aportar que esse processo é irreversível e deve se aprofundar. “O capital está aí. Só falta o mercado se profissionalizar”, resume o estilista Amir Slama.

Contribuição de Natalia e Barbara

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